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Sucessão

Um complexo processo no mundo empresarial

A mídia frequentemente divulga detalhes de processos sucessórios em grandes grupos do Brasil e do mundo. A maioria das empresas (de todos os portes) tem muita dificuldade de saltar para uma segunda ou terceira geração. A maioria é vendida, fundida ou mesmo dissolvida durante estes processos de transição.

Depois de 30 anos vivendo dentro desses cenários, posso tecer alguns comentários práticos sobre esta matéria.

Toda empresa tem um fundador ou mais fundadores.

Todo fundador imprime sua personalidade e sua forma de gestão. Porém, o tempo passa, e nesta década o fator de celebração é estratosférico. Vários membros da família podem chegar em curto prazo e se depor a trabalhar.

Parece ser um fato simples e lógico, mas nesta simplicidade pode residir uma grande problemática. O primeiro fato diz respeito a um fenômeno que tem íntima relação com a essência humana. São fraquezas de nossa espécie, como: inveja, ambição, sede de poder etc.

O fundador, aos poucos, estará envelhecendo e sua saúde física e de inteligência emocional não poderá competir com um possível sucessor, quer filhos diretos quer outros aparentados. O fundador (em via de regra) vai desejar que um(a) filho(a) seja seu sucessor. Ele deseja uma pessoa competente, inteligente e, se possível, uma “quase” réplica sua. Quando isto acontece de o sucessor ser bem qualificado, o fundador (de modo quase que inexplicável) poderá apresentar sintomas de inveja e medos sobre o seu próprio futuro. O pai reconhece a necessidade de seu sucessor e que, em breve, outra pessoa terá a liderança dos seus negócios. Isto pode criar no fundador um vazio de participação e importância para o seu futuro. Portanto, de um lado ele quer e tem orgulho do(a) filho(a) e ao mesmo tempo poderá ver o sucessor como um rival. Em face destes fatos, ele poderá ter uma atitude de ter críticas e cobranças exageradas e outras manifestações que não irão contribuir para o equilíbrio presente e futuro deste processo. Porém, compreendemos que perder o controle, a liderança etc. não são atitudes fáceis.

Os fundadores tendem a desejar que os filhos sejam uma cópia dele. Ou seja, um espelho de sua juventude. Isto dificilmente irá acontecer. O mundo, em apenas 30 anos, mudou de modo radical em todos os aspectos que possamos imaginar. Os sucessores mais jovens chegam aos 20-30 anos com valores, aprendizados e experiências totalmente diferentes daqueles de seus pais adquiridos no século passado.

Em muitos casos, os filhos e parentes podem entrar em uma luta sobre os possíveis sucessores e muitos tentarão “agradar” o fundador objetivando a chance de vencer esta disputa. O ódio e a disputa entre famílias são os piores. Eles podem gerar atitudes negativas cuja extensão pode levar ao caos de uma empresa.

Profissionais externos à empresa podem conduzir e melhor ordenar os processos de sucessão. Precisamos de vasto ferramental técnico e psicológico visando reduzir os quase inevitáveis confrontos. Modernamente, muitos sugerem que talvez a sucessão não irá ocorrer pelo uso de membros da família. A opção seria a contratação de executivos que ficariam subordinados ao conselho de administração. Este conselho pode ser composto por membros da família, além de outros profissionais convidados. O objetivo é aumentar a capacidade de julgamento e recomendações do conselho.

Esta opção não é, da mesma forma, fácil de ser implantada e mantida com sucesso através do tempo. Este processo pode demandar anos de trabalho da família, de seus consultores e advogados.

O mundo como um todo sofre dos mesmos problemas em relação a este tema. Mas, muito foi apreendido nestas últimas décadas e podemos contar com novas ferramentas de trabalho.

Nas reuniões com os advogados, os consultores e o(s) fundador(es), temos que levar em conta o falecimento do fundador (ou de um deles, no caso de haver mais de um fundador) durante o processo de sucessão. Esta hipótese de falecimento gera dezenas de simulações. Mas todos saem da reunião com bom humor e reconhecendo que tudo isto faz parte dos processos inevitáveis do ciclo da vida.

É importante novamente lembrar que poderá haver um combustível extra para aquecer possíveis desentendimentos e disputas. Eles são: mágoas, ciúme, ambição, dinheiro, poder, inveja entre outros. Todos estes sentimentos são fortes e podem estar persentes no DNA dos membros da família e de outros membros da empresa. Mesmo já passados milhares de anos de nossa atividade inteligente, ainda mantemos fortes os nossos instintos e raízes predadoras.

As equipes (funcionários) que estiveram presentes durante décadas em uma determinada empresa, certamente, irão acompanhar os diversos capítulos de um processo de sucessão. Elas também terão desafios de presenciar e participar de todos os eventos que irão suceder. O processo de sucessão pode desequilibrar uma empresa em seu processo comercial e de gestão criando uma guerra interna de grande porte. Há décadas, o mercado está a cada dia mais difícil. Todos os dias a globalização cria novos entrantes e novas ondas de tecnologias. Dezenas desses novos fatores podem mudar ou substituir produtos de sucesso de décadas anteriores.

Acho que as dificuldades aqui apresentadas fazem parte da natureza humana e da complexa passagem de bastão de um fundador para seus sucessores.

Porém, existem histórias de sucesso e de geração de sinergia positiva entre os diversos membros de uma empresa através do tempo.

Nós (consultores) podemos ajudar nestes processos, por sermos parcialmente mais isentos a essas emoções e partidarismos, e podermos por vezes dizer determinadas verdades que um diretor ou filho dificilmente faria.

Algumas de minhas experiências neste tipo de matéria, se contadas, iriam parecer como contos de ficção científica.

Talvez, lendo este artigo, seja você sucessor ou fundador, possa perceber e tomar atitudes proativas para que possamos disfrutar do sucesso passado e da mesma forma do futuro de sua empresa.

Dentro desse assunto, ainda devemos alertar:

  1. Há filhos que não querem suceder seus pais em seus negócios nem querem estar no conselho de administração. Muitos destes gostariam que a empresa fosse vendida ou mesmo que houvesse uma fusão e uso de outras opções. O respeito do fundador frente a outros desejos dos filhos deve ser considerado e outras opções devem ser estudadas para que haja equilíbrio na análise técnica de todas as opções disponíveis.
  2. Existem empresas que não tem somente um fundador e sim dois ou mais sócios (da mesma família ou não). Nestes casos, o processo de sucessão se tornará bem mais complexo em face dos diversos interesses envolvidos. Vender ou dissolver uma empresa pode ser uma saída mais fácil para todos. Porém cada caso é um caso.

 

Perguntas recebidas em palestras e cursos:

 

  • P: Uma empresa (mesmo sólida) pode desaparecer em face de um processo difícil de sucessão?

R: Sim e temos inúmeros exemplos, seja no Brasil ou no mundo.

  • P: Quais as atuais tendências do mercado mundial nos processos de sucessão?

R:

  1. Profissionalizar a gestão
  2. Retirar os sócios da família das decisões do dia a dia e levar para o conselho
  • Vender a empresa para terceiros
  1. Encerrar as atividades.

 

  • P: Existe o caso de uma empresa realizar uma “falência planejada” visando proteger um conjunto de bens registrados fora do patrimônio empresarial?

R: Sim e já participei de vários casos. Eles (fundadores) têm a motivação no fato de os sucessores não desejarem prosseguir e/ou o risco de uma perda futura com os novos gestores. Por vezes, os fundadores já têm seus bens protegidos e preferem falir a honrar com seus passivos. Muitos empresários se endividam com REFIZ e retêm os lucros para si mesmos.

Neste tema, o número de opções é muito vasto e geralmente elas fogem à ética e à lei. O Brasil, infelizmente, não tem vocação para a indústria e pesquisa, e as indústrias dos anos 40, 50 e 60 estão velhas e sucateadas. A marca poderá ser o ativo mais expressivo. O parque industrial (em média) não vale muito, mas as patentes/marca podem ainda valer um valor substancial.

  • P: A maioria dos meus amigos que trabalham nas empresas de seus pais indicam diversos graus de dificuldade em seu dia a dia. Eles vivem dentro de um cenário muito tenso e que o ambiente negativo na empresa é transferido para suas casas e suas famílias. Este fato é um recorrente no mundo prático?

R: Sim, e pode ser explicado. A vida em família é geralmente complexa por si mesma. Quando ela é transferida para um ambiente diário de 8 a 10 horas em uma empresa, poderá se transformar em uma batalha mais sofisticada de egos e de personalidades. Caso o ambiente financeiro interno seja igualmente difícil, isto poderá causar um grande aumento na “temperatura” do trabalho diário. Da mesma forma, quando existe riqueza a disputa também será um relevante fator de disputas entre os membros-diretores da empresa.

  • P: Como reduzir ou prevenir perdas durante um processo sucessório?

R: Primeiro fato: sucessão não demanda a morte do dono. Segundo: este tipo de processo raramente é conduzido com sucesso por membros internos (sejam eles da família ou não). Sucessão tem meandros jurídicos, psicológicos, estratégicos e técnicos e estes não podem ser ignorados ou conduzidos por leigos. A sucessão deve ser vista como um processo proativo. Ou seja, o processo sucessório deverá ser feito quando o fundador e o negócio estiverem sadios.

  • P: Será preciso ter advogados competentes nesta área e consultores capacitados para avaliar os sucessores, treinar e preparar a empresa para este processo? Um trabalho que pode demorar de 2 a 3 anos. Acho que as modernas empresas terão um ciclo de vida bem mais curto que as do século passado e a mutação rápida da tecnologia não propicia a longa permanência dos negócios. Estou certa?

R: Uma pergunta interessante. A maioria das empresas mais ricas do mundo, nas ultimas décadas, perderam sua posição no ranque internacional, seja por perda de seu patrimônio líquido, marca (Goodwill) ou por terem sido adquiridos como fruto de uma fusão, cisão etc. A durabilidade de uma empresa geralmente está mais restrita à primeira geração. Este fato também se deve as mudanças na economia local e mundial. E certamente, não devemos esquecer os efeitos produzidos pelas mudanças tecnológicas. Não devemos esquecer que há uma contínua necessidade de capital para manter as empresas competitivas e que desejam passar de uma geração para outra. Existem países que estão retornando ao nacionalismo, que é, por vezes, um modelo mais predatório. Hoje, no Brasil, a maioria das empresas com mais de 50 anos aceitam propostas de venda. Os herdeiros geralmente apoiam tais propostas. É melhor ter uma herança em dinheiro e bens do que em uma empresa que poderá ser um risco para os futuros sucessores.

P: Você valoriza o fato de que o processo de sucessão deveria ser realizado no timing correto. Pode comentar?